sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Os invisíveis

Segundo o dicionário Aurélio a palavra estiva, resulta do serviço de movimentação de carga nos portos, realizado pelos estivadores. O que na verdade tem um valor e um significado muito maior do que a teoria explica. Está concentrado ali, naquele homem, todo o esforço que traria, e trouxe como produto o desenvolvimento de uma região, e de um país.

Neste caso, usamos João como nome para distinguir o personagem, embora pudessem ser tantos outros para retratar a realidade de todas as vítimas de uma mesma história.

João era pobre, morava com sua mulher, em uma vila cercada por áreas de plantação, viviam do que o trabalhador ganhava pelo cultivo da terra. Vieram os filhos e a situação apertou, mas não a ponto de abalar a esperança. O homem prometeu a todos que daria uma vida melhor para eles, Partiram para Santos, cidade que, na época, iniciava seu desenvolvimento e prometia bons trabalhos portuários.

Chegando lá a situação foi controversa, o que conseguiu de emprego, devido à baixa escolaridade, foi o serviço de carregamento e descarregamento de carga até os navios. Agora se tratava de um estivador, embora não soubesse ele que miserável seria tanto quanto fora onde morara antes. Anos difíceis aqueles.

O trabalho no porto exigia um esforço físico desigual, medido por limites, dava-se o que se podia, carregava o máximo que conseguisse da forma que fosse, o que, posteriormente, gerava problemas de coluna, por exemplo. Reduzia ainda mais a esperança de vida.
As condições de trabalho eram insalubres, o lugar era sujo, sem saneamento, sem asfaltado e que reunia pessoas de diversos lugares, que eventualmente traziam doenças, que se tornavam pestes e atingia a toda aquela camada populacional.

A cidade de Santos e de Paranapiacaba estavam crescendo bastante naquela época, vieram às ferrovias que ligavam as cidades ao interior. O fluxo de mercadoria aumentava, e era requisitado um esforço maior no porto. Que posteriormente traria como resultado o desenvolvimento da região e o surgimento de grandes metrópoles comerciais.

Os verdadeiros responsáveis por este enriquecimento eram esquecidos. Não tinham direitos que os defendessem. Explorados como podiam por demasiado período de tempo, recebiam praticamente nada, quando possuíam problemas não obtinham o mesmo potencial eram simplesmente trocados por outros mais jovens. E todo o esforço que depositaram ali era vão, pois o justo era receber enquanto se podia produzir, não era levado em conta o porquê da impotência.
João como tantos outros segue sofrendo, sua família tem fome e estudos para seus filhos não pode dar. Encontrou esperança, lutou e chegou ao mesmo lugar. Os ricos esnobam o poder que ele e seus colegas os ajudaram a adquirir. Daqui a uns anos morre, e o mesmo acontece com seus filhos, e assim sucessivamente até alguém os enxergar. São imperceptíveis, e são muitos. Estão por ai, em todos os lugares, só não os vê quem não quer.


música: Construção – Chico Buarque (versão com intervenções diferentes).
A intenção era escutar a música enquanto se lê o texto, embora a letra trate de operários, pode se pensar no trabalhador em geral e na construção com tijolos (como ele diz) no sentido de enriquecimento do país. Cabem várias metáforas, que deixo ao leitor desvendar. Embora a letra seja bastante significativa, especialmente esta melodia está com algumas intervenções e estabelece o clima que procurava.

Júlia Simchen Zimmermann

Fotos feitas por mim na BOLSA DO CAFÉ (Santos).

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