quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Minha vida, meu espaço


Pescador. Essa não é uma profissão muito renomada, se é que pode ser considerada uma profissão. Gosto muito do que faço, pode não ser lá grandes coisas, mas é a tradição da família. Meu tataravô, bisavô, avô e agora eu. Passado de geração em geração pretendo fazer com que meu filho continue esse belo patrimônio que Deus nos proporcionou.

Filho de peixe, peixinho é, esse ditado parece feito para nós caiçaras que seguimos uma tradição e temos um modo diferente de viver das pessoas da cidade, mas mesmo assim é o nosso jeito e aprecio muito isso.

Moramos em uma humilde casa, que fica na parte mais baixa de uma montanha que dá de frente para o mar e pé na areia. Na ilha temos amigos, parentes... Moro com meu filho Joaquim, de oito anos, minha mulher Rosa e minha mãe Benedita, de 93 anos. Da nossa casa podemos ver a cidade de Santos e grande parte do porto. Não posso dizer que aprecio muito essa paisagem, pois vemos prédios e mais prédios, navios indo e vindo toda hora e cargas que atracam no porto, enquanto poderíamos estar vendo e apreciando as riquezas que a natureza nos oferece.

Os tempos mudaram, muitas coisas evoluíram e continuam evoluindo e os espaços também se modificam conforme essas transformações, até nós, caiçaras, fomos atingidos por essas mudanças. A dificuldade de pescar nessas águas é inexplicável, pois com o surgimento do porto sumiram os peixes nesta região. Então como eu e minha família vamos sobreviver sendo que a pesca é a base das nossas vidas? O nosso espaço foi invadido e sem permissão.

A fase de transição começou lá atrás quando meu bisavô ainda era vivo. As pessoas estavam empolgadas com essas transformações, com o surgimento do porto, das ferrovias, das indústrias, o desenvolvimento da cidade e o crescimento da economia. Parecia que só nos éramos contra aquilo tudo. A nossa existência depende da natureza e do que ela nos proporciona. O nosso trabalho daqueles dias em diante só piorou, mas minha família nunca abandonou a cultura e então porque é que eu havia de abandonar? Vivo como posso, como for possível.

Por que então não morar na cidade? A resposta é porque a vida lá para quem não tem nada (ou seja, dinheiro) é muito mais difícil do que aqui, e também seria um desrespeito com a tradição da família e o abandono do meu espaço do meu mar e da minha areia que valem mais que qualquer dinheiro desse mundo.

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Desde antigamente as pessoas da cidade – “do continente” como chamamos – não dão importância para nós e para o nosso modo de viver. Uma cultura inteira, uma tradição, uma família, uma vida, não podem ser jogadas fora ou esquecidas, simplesmente por causa da evolução, do desenvolvimento. É preciso conciliar as coisas e não simplesmente ignorar aquela que menos importa.

Portanto é preciso prestar muita atenção porque qualquer mudança que ocorre em nosso espaço atinge mais pessoas do que imaginamos.


Bianca Bunduki Schaefer

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