quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Mulheres da Vida

Três homens por noite, quarenta reais a hora mais o quarto do motel. Esse é o meu preço, esse é o preço da melhor noite que um homem pode ter. Sou considerada uma das melhores, pelo menos toda noite alguém me procura na minha casa. A esquina que eu considero a mais movimentada da noite paulista. Surpreso com o meu trabalho? Ah, não fique. É apenas outro jeito de ganhar a vida nesse mundo injusto.
Enquanto homens e mulheres distintos, como meus pais já falecidos, estão vendendo sua sabedoria, eu estou aqui, vendendo o meu corpo. Um absurdo, mas uma realidade que vem lá de trás. No porto de Santos, por exemplo, a prostituição era algo usual, quando homens chegavam de longas viagens e não podiam esperar para usufruir do melhor que o sexo oposto pode lhes oferecer.
Fui surpreendida quando a regra número um do meu trabalho foi quebrada. Apaixonei-me por um de meus amantes, casado, rico, com três filhos. Meu Deus, onde esse mundo vai parar? O que um homem que tem tudo vai querer com uma prostituta que ele encontrou ali na esquina? Não sei, mas alguma coisa estava faltando e fui eu quem deu isso a ele. Esse homem além de mexer com o meu coração, já que me apaixonei por ele, também mexeu com a minha vontade de descobrir porque homens que têm tudo desejam prostitutas, como eu. Queria sair de São Paulo, para saber mais dos homens que não estavam tão perto de mim. Consegui carona com um caminhoneiro que estava indo em direção a Santos, com parada no Ecopatio, onde ficaria até que seu caminhão de cargas fosse liberado.
A prostituição é algo que hoje podemos comparar com a lei da oferta e procura. Se não houvesse tantos homens atrás de uma diversão a mais, de uma fuga, de uma forma de poupar a carência, não haveria tantas prostitutas por aí.
Existem homens que têm tudo e não têm nada; e homens que simplesmente não têm nada. São esses os caminhoneiros que encontrei ali no Ecopatio. O que era uma “vila da morte” se tornou uma vila de solidão, de espera, mas mesmo assim, de conforto. Estão ali homens que ficam dias, meses longe de suas mulheres e filhos, e contam apenas com os novos e breves amigos que viram família naquele ambiente. São homens que desejam prostitutas para ter um pouco do que não podem ter por estarem longe de casa por tanto tempo, sozinhos, sem diversão, sem a necessária companhia do sexo oposto. Assim como os homens que chegavam ao porto de Santos depois de longas viagens. Olhares infinitos me acompanharam enquanto traçava aquele tapete vermelho feito de asfalto.
Voltei a pensar, porque homens que têm tudo nos procuram? Alguns homens procuram prostitutas para "usar", outros para "serem usados". Fuga, diversão, luxúria. São esses os principais motivos pelos quais homens formados resolvem ter uma noite longe de tudo. O desejo de sair da monotonia, de utilizar a válvula de escape daquele compromisso, daquela pressão, daquilo que necessita ser perfeito, porque se não é, não está bom o suficiente. Mas ninguém consegue fazer tudo e estar sempre perfeitamente do jeito que a sociedade quer, ou do jeito que você mesmo quer, e você precisa simplesmente fugir. E é como se aquela mulher ali na esquina, que está completamente disponível para você independente de sua capacidade, cor ou raça, fosse a sua última luz visível, a luz do fim do túnel, a porta para o paraíso. Você dá o dinheiro, e ela te dá o prazer. É uma troca, justa, porém, injusta.
Dentro desse conjunto de homens também há aqueles que usam a prostituição para se divertir. Nesse sentido eu me sinto abusada, mas não há nada que eu possa fazer. Luxúria, é disso que podemos chamar o desejo de um homem de se aproveitar de uma mulher, apenas para se divertir, enquanto tem uma casa, uma família e uma esposa que supostamente ama, para cuidar.
Vou embora deixando os olhos solitários, as risadas malvadas, e também aqueles que se levaram pela luxúria e ainda torço para que eles achem seus caminhos assim como eu vou encarar o meu, e vou voltar para casa.
Na manhã da minha partida estava lendo no jornal que uma pesquisa conduzida em nove países constatou que prostitutas que foram abusadas, agredidas e estupradas mostraram sintomas de transtorno de estresse pós-traumático, no mesmo nível de veteranos de guerra e vítimas de tortura. Não e o meu caso, mas não deixa de ser uma realidade que comprova que a prostituição, sob nenhum ponto de vista ou razão, é correta, e que muitos são os tipos de prostitutas, como são muitas as razões pelas quais os homens as procuram. E isto deve ser levado em consideração em um debate adulto sobre sexualidade.
Não me orgulho da minha profissão, mas tenho um sonho, um sonho que após noites e mais noites será realizado. Vou deixar para vocês me imaginarem em uma situação diferente, diferente da que eu me encontro, e enquanto isso vou continuar esperando por noites e dias melhores. E um dia vão ficar sabendo de mais uma historia de heroísmo, garra e forca. Vão ficar sabendo da minha historia.

OBS: as imagens foram poupadas, quem viu e viveu sabe exatamente o que eu transcrevi no texto. Quem não pode, apenas imagine, e sinta o que eu senti e passei para esse texto.

Luiza K. Barbosa

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